Por; Fernando Dacosta – jornal i
Nós que temos,
como disse Agustina Bessa Luís, “a cultura da afectuosidade como outros povos
têm a da matemática e a da filosofia”, estamos a sofrer, através dos
governantes que nos saíram ao caminho, uma destruição identitária só comparável
com a imposta pelo Santo Ofício.
Trata-se da
destruição da nossa natureza afectiva, aquela de que falava Agustina, de
consequências arrepiantes. O que está em curso é, na verdade, um crime
metódico, faseado contra a essência, a dignidade que nos ergueu vai para mil
anos.
O esmagamento dos
idosos fez-se, por exemplo, a investida mais aviltante (porque mais covarde)
desse plano, abatida sobre reformados e pensionistas, doentes e diminuídos, com
devastações simultâneas em desempregados e jovens (estes expulsos do território
como os judeus de outrora), visando liquefazer o húmus agregador do país.
Lançar novos contra velhos, trabalhadores contra excedentários, privados contra
públicos, faz parte dessa subterrânea canalhice.
Os economicistas
de serviço fazem contabilidade de tudo, e ficam sorridentes com os balancetes
apurados, e brindam a eles sem estremecimento pela dor, pela hecatombe que
provocam em milhões de caídos na miséria, na doença, no abandono, na
destruição.
Quando se
reerguer, Portugal logo atirará para o fosso da história, como sempre fez, os
que o mancham de nojo e terror – ante a conivência de quem devia impedi-los.
Presidência da
República, eleições antecipadas, partidos opositores bloquearam-se,
bloqueando-nos, adiando-nos.
Será que só nos
resta acender velas ao Tribunal Constitucional, o último altar que, entre
tantas e caras (e inúteis) expressões de soberania democrática, nos pode valer?
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