Ana Sá Lopes – jornal i
Já foi há muito ultrapassado o limite do normal funcionamento das instituições
A sondagem encomendada pelo Instituto Europeu da Faculdade de Direito de Lisboa à Eurosondagem revela, pela primeira vez de uma forma brutal, aquilo que se pressentia nas ruas: a maioria esmagadora dos portugueses – genericamente silenciosa – está contra o cumprimento do Memorando da troika. O número dos que defendem a posição habitualmente enunciada pelo PCP e pelo Bloco de Esquerda (denunciar o Memorando e procurar alternativas) é impressionante face ao peso eleitoral dos dois partidos: 41,5%! A defesa da renegociação profunda do Memorando – a posição oficial do PS – é partilhada por 41% dos inquiridos. A política revolucionária do governo em curso (“cumprir o acordado”) apenas tem o apoio de 10,8%. O “ajustamento” só é “bonito” na cabeça estalinista do ministro das Finanças – todas as previsões, do desemprego à recuperação económica, falharam estrondosamente. E quando Gaspar diz que “o ajustamento do sector privado foi notável, exactamente como o previsto”, esqueceu-se de dizer que quem previu as consequências deste ajustamento foram outros – a começar no desemprego galopante –
e que só uma cabeça desconcertada lhe pode chamar “notável”. É óbvio que este governo já não está em condições de negociar o que quer que seja com a troika – ou com Durão Barroso, a quem recentemente Merkel, armada em polícia boa por um dia, culpou pelo desastre da austeridade. A agenda do Conselho de Estado é um exercício inútil: Portugal não tem que discutir o pós-troika, tem que discutir o programa da troika, que é o programa do governo, porque no pós--troika, como dizia o outro, que até era razoavelmente popular em Belém (Keynes), estaremos todos mortos.
A única via possível para acabar com este processo de revolução liberal em curso é a convocação urgente de eleições. Já foi, há muito, ultrapassado o limite, não só dos sacrifícios – como dizia Cavaco relativamente aos cortes de Sócrates – como do normal funcionamento das instituições. Se houvesse alguém em Belém no pleno uso das suas faculdades constitucionais, o reconhecimento institucional do desaparecimento do governo seria mais célere.
a)PREC
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