É
preciso chegarmos a velhos para que o Estado faça pouco de nós, somando os seus
maus tratos às nossas fragilidades».
Durante
a minha vida profissional, ninguém me explicou a eventualidade de, um dia, um
Governo português decidir diminuir a pensão a que teria direito quando
cumprisse os 65 anos e por ter sido honesto nas minhas obrigações, com o
privilégio de ter trabalhado em empresas cumpridoras. Pensava, ingenuamente,
que o Governo, a ser democrático, como tanto desejava, seria pessoa de bem.
Foi
uma ilusão, que tenho pago caro, ter sido tão ingénuo! Puro engano!
Acreditei
de boa-fé na seriedade e fiabilidade dos compromissos e, afinal, tenho vindo a
ser esbulhado na minha pensão, com sacrifícios que pesam - e isso ainda me faz
sofrer mais - na vida de tantos reformados, alguns dos quais, da minha geração,
estão a ser o suporte de retaguarda de filhos desempregados e de netos que
crescem para a vida.
Estamos,
para bem, a viver uma esperança de vida alargada, mas, para mal, a pagar uma
fatura muito cara, que nos desgraça impunemente a qualidade de vida!
Sou
do tempo em que entravam nos cofres públicos mais contribuições de quem exercia
ativamente a sua vida profissional do que os custos que o Estado suportava a
pagar pensões. Mesmo assim, nunca acusei o Estado de se servir desses fundos
para cobrir, não sei se com acerto e justiça, os seus défices e em que áreas
era deficitário e que precisariam das contribuições de trabalhadores honrados.
É
preciso chegarmos a velhos para que o Estado faça pouco de nós, somando os seus
maus tratos às nossas fragilidades, agravando-as até a uma pesada amargura.
Trata-nos como pessoas descartáveis, usando-as e deitando-as fora.
Chega-nos
agora a Contribuição Extraordinária de Solidariedade (CES) como mais um veneno
a matar-nos a esperança. Se não é um imposto, o que será para, ao menos,
entendermos se vale a pena tantos sacrifícios?
Lamento
ter andado uma vida longa a aconselhar a ética dos impostos para convencer as
pessoas a ter respeito pelo bem comum que nos competiria salvaguardar e não
apenas ao Estado. Vivendo do meu salário de profissional da Imprensa, estatuto
que sempre teve a concordância explícita dos meus bispos, decidi renunciar a
qualquer legítima remuneração por serviços pastorais, exercendo o ministério
sacerdotal em regime de voluntariado. O salário chegava-me, como sonhava que a
reforma também me bastaria. Mais um engano na minha ingenuidade, espoliada e
maltratada por um Governo sanguessuga.
Não
estou arrependido por ter semeado o bem. A minha consciência social não a troco
por nada. Considero a CES uma abusiva e vergonhosa arbitrariedade. Como
escrevia, há dias, Bagão Félix, ex-ministro das Finanças, «a ideologia punitiva
sobre os mais velhos prossegue entre um muro de indiferença, um biombo de
manipulação, uma ausência de reflexão coletiva e uma tecnocracia gélida».
Cónego
Rui Osório
In
Voz Portucalense, 22.1.2014
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