Ninguém é insensível à
dor e ao luto dos que perderam os entes queridos, no inferno dos fogos, e os
haveres na voragem das chamas, mas há abutres que continuam atraídos pelo odor
dos cadáveres e exploração dos sentimentos, sem respeito pelos defuntos.
Curiosamente, ninguém
pergunta aos autarcas o que fizeram para prevenir incêndios e o que falhou nos
planos de protecção civil, que lhes cabia elaborar e executar; ignora-se a EDP,
cujos fios de alta tensão atearam fogos; esquecem-se incendiários que a PJ filmou
em flagrante; isentam-se os donos das matas das obrigações de limpeza. Há quem
ganhe com a desgraça e capitalize danos, enquanto a direita procura incinerar o
Governo nos fogos que espevita.
Deixemos repousar os
mortos e as famílias fazerem o luto, que as filmagens impedem e a oportunidade
de aparecer na televisão, com o PR, dificulta.
É altura de saber por
que motivo não há quem peça a um juiz que permita o acesso aos seguros dos que
os tinham; se há forma de punir quem, tendo seguro, se candidatou aos subsídios
concedidos; se é permitido vender as casas feitas para quem não as habita, e se
deviam ser reconstruídas outras, onde os ex-moradores não querem voltar.
O circo mediático e os
partidos da direita, ansiosos por acusarem este Governo e inaptos para
escrutinarem IPSS de direito canónico, caucionam oportunismos e desonestidades.
Sob o ponto de vista
material chegam ecos de que só há beneficiários e de que a pressão mediática
levou a construir casas onde apenas havia ruínas, já isentas de IMI, para além
de terem – e bem –, sido dotadas de instalações sanitárias as casas que não as
tinham.
Na tempestade de afectos, por entre ralis de beijos e gincanas de abraços, a repetição dos
itinerários oculta e estimula o oportunismo que medra no húmus da desgraça. O
decoro e o pudor deviam moderar as filmagens de missas, viagens e encontros nos
locais que a tragédia mediatizou. A dor não deve alimentar vaidades e oportunismos
e, muito menos, benefícios indevidos e obscenos.
Ontem, o presidente das
CEP relembrou os incêndios, para exumar os cadáveres para a mensagem de Natal.
Referiu os corpos carbonizados e esqueceu 13 mortos e 52 feridos esmagados, à
saída da procissão, em 15 de agosto, por um carvalho paroquial da igreja do
Monte, no Funchal. Omitiu os que se finaram porque Deus foi servido de os
chamar, e lembrou os que morreram por incúria do Governo da República.
O PR, que, depois de
regressar do Funchal, não consta ter rezado uma só novena pelos mortos da
procissão, regressou hoje, em pio necrotropismo, a mais uma missa, a apelar aos
portugueses para visitarem as zonas ardidas de Pedrogão.
Ámen.
(Artigo de Carlos Esperança https://www.facebook.com/carlos.esperanca.)
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